sábado, 22 de outubro de 2016

Algures

Pelas ruas, o calçamento, de maneira geral, é de pedra portuguesa.
Nas vielas mais antigas, o estilo pé de moleque, com destaque às pedras São Thomé.
Nas entranhas, o mato cobra constantemente pelo reparo e capina.
Pelas residências ao longo das contáveis ruas, casarões traduzem um período mais provinciano.
Existe na arquitetura um formato meio que padrão naquelas casas de pé direito alto, com janelas altas, protegidas por tramela.
Quem hoje vive nas casas já está, no mínimo, na quarta geração da fundação de suas estruturas de braúna.
Muitos proprietários nem mesmo possuem vínculo com as famílias outrora proprietárias, apenas são os novos donos. Mesmo assim, mantém-se de certa forma alguma preocupação em conservar o padrão das fachadas e todo o interior.
Ao forasteiro da cidade maior, a ideia da superioridade cultural pode ser percebida já nos primeiros minutos de conversa.
Pelas ladeiras, alguns comércios ainda mantém a tradição de vendas a granel, no estilo ‘secos e molhados’.
Fácil achar um armazém e comer um pedaço de queijo, combinado com rapadura, goiabada cascão...
Nem tão raro assim, a tina guardada na despensa tem a carne de porco e torresmo conservados na banha, mantendo-se tradição similar ao período dos tropeiros.
Sentado num caixote simulando um tamborete, a hora pode passar sem ser percebida entre conversas e casos, sobretudo da vida alheia.
Para hospedar, algumas pensões oferecem estadia.
Almoço pode ser com um cardápio variado, o que pode ser inusitado para quem não está acostumado com a vida rural.
Na longa mesa faz-se um carreirão: comidas de todo tipo.
Iguarias são preparadas num processo em que não se tem tanta pressa.
Fogão à lenha.
Frango, quando incluso no cardápio, é abatido no mesmo dia, ao ser apanhado no quintal ou terreiro.
Na mesa, o fubá que gerou o angu, veio moído do moinho de pedra.
O arroz, socado no pilão.
O café tem os grãos moídos pouco tempo antes da fervura, irradiando um cheiro de harmonia.
Nas receitas culinárias feitas ao longo da tarde, sempre com uma preocupação em fazer algo além do consumo normal da família, pois será oferecido um pouco à vizinhança.
Há um conceito solidário: não se devolve vasilha vazia.
Para os resfriados, indisposições e mal-estar em geral, há sempre um remédio caseiro, preparados com ervas medicinais que muitos plantam no quintal.
Às 6 da tarde, as badaladas do sino da matriz ecoam fielmente todos os dias.
Pela madrugada, o canto do galo começa com uma serenata até a saudação da manhã. E esta prática se repete pela maioria das casas, produzindo uma orquestra pelo arraial.
O relógio de bolso é um artigo típico dos homens, mas as horas podem se medir pelos sinais da natureza.
Às pessoas mais antigas, uma interação maior entre tempo e espaço.
Nas famílias, preocupações com a tradição e valores.
Exaltação da prática da virtude nem sempre seguida por quem verbaliza.
Muitos antagonismos entre o discurso e a prática.
A convivência com alguns poderá mostrar um contraste entre essência e aparência.
Os rótulos e a história antecipam algumas coisas e podem desvirtuar uma nova interpretação da realidade.
Se conveniente, versões podem valer mais que os fatos.
Na política, o coronelismo ultrapassa gerações, e sempre reaparece numa versão diferenciada com o decorrer dos anos. E aos novos, a continuidade das velhas ideias.
Em algum lugar ainda deve ser assim...

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